A
cidade de Ardabil, ao norte do Irã, à beira do Mar Cáspio e na divisa com o
Azerbaijão, possui uma longa história. É conhecida por ser o local de
nascimento do profeta Zaratustra, fundador do zoroatrismo há aproximadamente
3500 anos, uma das primeiras religiões monoteístas da história. O nome da
cidade vem do zoroastrismo, e significa algo como local sagrado. Lugar perfeito
para o nascimento de um Shahriar (rei). Esse foi o apelido dado para Ali Daei,
nascido em Ardabil no dia 21 de março de 1969. Maior jogador da rica história
do futebol iraniano, Ali Daei colecionou gols em seus 46 anos de vida.

Desde
os 14 anos, jogava pelo Esteghlal Ardabil, e estreou profissionalmente aos 19
anos, em 1988. Chamou a atenção do Taxirani, de Teerã, onde atuou pela
temporada de 89-90. No ano seguinte, mais uma transferência, dessa vez para o
Bank Tejarat, também do Teerã. Essa fase da carreira de Daei possui poucos
registros, e as estatísticas são desconhecidas. Entretanto, foi aí que começou
a fazer sua fama como homem-gol. Não à toa, foi convocado pela primeira vez para
a seleção em junho de 93.
No
mesmo mês, pelas eliminatórias para a Copa de 94, anotou seu primeiro gol pela
seleção, na goleada por 6 a 0 sobre o Taiwan. Em 94, acertou com o Persepolis,
uma das maiores equipes do país para enfim conquistar seu primeiro título, o
campeonato iraniano da temporada 95-96. Em sua primeira passagem pela equipe,
assinalou, de acordo com números do site Ogol.com, 25 gols em 44 partidas.
Em
96, pela Copa da Ásia, Daei já tinha 21 gols internacionais. Número expressivo
que só aumentou com atuações de gala na principal competição do futebol
asiático, sendo o grande nome da equipe que alcançou a terceira posição. Daei
marcou um gol em cada uma das três partidas da primeira fase, e reservou o
melhor para as quartas-de-finais contra a Coréia do Sul. Vitória de 6 a 2 com
quatro gols marcados pelo camisa 10 iraniano. Nas semifinais, entretanto, o Irã
empatou sem gols com a Arábia Saudita e acabou eliminado nos pênaltis, com Daei
desperdiçando a primeira cobrança iraniana. Na disputa de 3º lugar com o
Kuwait, marcou o gol do empate, e viu sua equipe vencer a partida nos pênaltis.
A
campanha o levou para o Al Sadd, do Catar, mas o atacante já estava na mira do
futebol europeu. Após 10 gols em 16 partidas pelo clube catari, Ali Daei foi
contratado, junto com seu companheiro de seleção e também de Persépolis, o meia
Karim Bagheri, pelo alemão Arminia Bielefield, que havia acabado de retornar à
Bundesliga. No Arminia, foram 26 jogos (25 pela Bundesliga e um amistoso) e 7
gols. Logo em sua segunda partida, contra o Stuttgart, marcou seu primeiro gol.
As boas atuações de Daei, entretanto, não impediram o clube de ser rebaixado
novamente como lanterna da competição. Mas foram o suficiente para atrair a
atenção do maior clube da Alemanha, o Bayern de Munique.
Antes
disso, porém, Ali Daei disputaria sua primeira Copa do Mundo. Durante as
eliminatórias, havia marcado nove gols, e só não balançou as redes nos dois
duelos decisivos com a Austrália, na repescagem, mas foi fundamental para garantir
a classificação do Irã para o Mundial da França. A primeira partida, em Teerã,
havia terminado em 1 a 1. O segundo jogo, em Melbourne, era vencido pela
Austrália por 2 a 0 até os 26 minutos do segundo tempo. Bagheri diminuiu, e
apenas quatro minutos depois, após belíssima assistência de Daei, Aziz marcou o
gol da classificação. "Aquele 29 de novembro de 97 ainda está em meus
sonhos. Foi inacreditável", disse em entrevista ao site da FIFA, em 2007.
No Mundial, o Irã acabou eliminado ainda na primeira fase, Daei não marcou
gols, mas ao menos, venceram os Estados Unidos em um jogo histórico, com
diversas ações de esportividade dos atletas de duas nações que de tempos em
tempos vivem tensões políticas.
Com
o clube bávaro, assinou um contrato de três anos. Na temporada 98/99, disputou
31 partidas, a grande maioria entrando no meio dos jogos e marcou apenas seis
gols, mas conquistou o Campeonato Alemão, a Copa da Liga alemã e viu do banco
de reservas o Bayern cair nos minutos finais da final da Liga dos Campeões
diante do Manchester United. Aliás, Daei foi o primeiro asiático da história a
disputar uma partida da Liga dos Campeões. Vestir a camisa de um gigante e
conquistar títulos, mesmo que no banco de reservas, seria suficiente para
alguns, mas não para Ali Daei. As poucas oportunidades como titular o
incomodavam, e ele resolveu rescindir o contrato e partir para uma nova
experiência no futebol alemão.
Em
99/2000, desembarcou em Berlim para fazer parte do elenco do Hertha, que
disputaria a Liga dos Campeões. Nos play-offs, diante do cipriota Anorthosis,
marcou seu primeiro gol pela competição continental. Mas como se sabe, a UEFA
contabiliza apenas os gols da fase de grupos em diante. Não houve problema,
afinal, no dia 21 de setembro de 99, Daei marcou os dois gols da vitória do
Hertha sobre o Chelsea por 2 a 1. Ainda foi o autor do gol de empate contra o
Milan, na semana seguinte. Apesar disso, teve uma pequena queda de produção,
voltou a figurar na reserva, e marcou apenas mais dois gols até o final daquela
temporada. Ainda assim, no início do ano 2000, foi eleito o melhor jogador
asiático do ano de 99, prêmio concedido pela Confederação Asiática de Futebol.
Na
temporada seguinte, Daei começou com tudo, marcando nas cinco primeiras
partidas, mesmo saindo do banco em quatro delas. Mas novamente, não conseguiu
se firmar entre os titulares e não balançou mais as redes no restante da
temporada. Em 2001/2002, fez apenas 12 partidas pelo clube alemão sem marcar
gols. Ao menos pela seleção iraniana, Daei jamais deixou de ser o principal
nome da equipe. Ainda assim, a repescagem contra a Irlanda não conseguiu ser
superada, e o Irã acabou vendo da TV o primeiro mundial realizado no continente
asiático.
Após
o fracasso nas Eliminatórias, Daei retornou para a Ásia. Já com 34 anos,
assinou com o Al Shabab, do Emirados Árabes, e marcou 11 gols em 25 partidas.
Em 2003 voltou ao Irã para uma nova passagem pelo Persépolis, com 16 gols em 28
partidas. Em 2004, acertou com o Saba Battery. Talvez tenha sido uma das
grandes decisões de sua carreira. Pelo clube de Teerã, que posteriormente se
mudaria para a cidade de Qom, Daei marcou 35 gols em 65 partidas e foi campeão
da Hazfi Cup (inclusive convertendo um dos pênaltis decisivos) e da Supercopa
do Irã, além de ter disputado uma Liga dos Campeões da Ásia. Também em 2004,
fez uma de suas partidas mais memoráveis, marcando quatro vezes contra Laos, em
sua 100ª partida pela seleção iraniana.
Apesar
dos bons números, seu contrato não foi renovado. Aos 36 anos, disputou sua
segunda Copa do Mundo, mas longe da forma física ideal, disputou apenas duas
partidas, novamente, sem marcar gols. E quem pensou que veria o jogador se
aposentar, se surpreendeu com Daei liderando o Saipa, clube de uma indústria de
automóveis de Teerã, ao título nacional em 2006-07. Também como treinador da
equipe, marcou um dos gols na partida final do campeonato. Coroado, enfim
decidiu se retirar dos gramados.
Goleador,
exímio cabeceador, ainda possuía muita habilidade, apesar dos 1,92 de altura.
Detém o recorde de mais gols por uma seleção nacional, com incríveis 109 gols
em 149 partidas pelo Irã. Assumiu o recorde anterior, de 84 gols do húngaro
Férenc Puskás, em 2003, em uma partida contra o Líbano. O mais curioso, é que
de 1996, ano em que atuou pelo Al Sadd, do Catar, até 2007, quando se aposentou
pelo iraniano Saipa, Daei marcou 132 gols em 345 partidas por clubes, número
apenas um pouco superior ao marcado pela seleção. Em 2005, quando tinha 102
gols, chegou a declarar ao site da FIFA que chegaria aos 120 gols. Não
conseguiu bater a meta, mas marcou seu nome na história do futebol mundial. É
também o maior artilheiro da história das eliminatórias para a Copa, com 35
gols.
A
seguir, você pode ver o vasto repertório do Rei Persa: gols de pé direito,
esquerdo, de habilidade, de raça, na bola parada e, claro, no excelente jogo
aéreo do jogador, que sabia se posicionar e cabecear como poucos.
Durante
sua carreira, Ali Daei fez dupla de ataque com três brasileiros em sua passagem
pelo futebol alemão: com Élber, no Bayern de Munique, com o falecido Alex Alves
e com Marcelinho Paraíba, ambos pelo Hertha Berlim. Mas é do atacante do Bayern
que Daei tem as melhores recordações. Em uma entrevista ao site da FIFA,
questionado sobre um jogador que ele admirava, Daei respondeu que era difícil
escolher um, mas que se inspirava em Élber.
Além
dos gols e das campanhas na Copa da Ásia e em Copas do Mundo, Daei foi bicampeão
como jogador da West Asia Football Federation Championshp, em 2000 e 2004, e
levou o tri em 2008, em sua curta passagem como treinador do selecionado.
Se
no Team Melli, seu desempenho como treinador foi abaixo das expectativas, nos
clubes conseguiu alguns bons resultados. No Saipa, logo após pendurar as
chuteiras, levou o time ao título da Copa do Golfo Pérsico. Depois do período
na seleção, assumiu o Persépolis, e sagrou-se bicampeão da Hazfi Cup (2010 e
2011). Depois teve uma passagem pelo pequeno Rah Ahan, e retornou ao
Persepólis, onde não durou muito. Após um período de quase um ano sem treinar
nenhuma equipe, Daei assumiu o Saba Qom, em julho de 2015, onde possui fraco
desempenho, bem abaixo do que costumava fazer quando tinha a bola nos pés. Certa
vez, disse uma frase que resumiu bem seu estilo de jogo, mas também seu modo de
vida.
"Durante
todos esses anos, futebol foi a minha vida, e marcar gols foi a minha
prioridade".
***
Texto
publicado originalmente em 11 de maio de 2016 no blog Escrevendo Futebol.
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